terça-feira, 31 de março de 2009

NÃO É FÍSICO! É TÁCTICO!

Táctica: arte de ordenar; estratégia ou sistema pensado habilmente de forma a conseguir bons resultados num jogo (in Dicionário da Língua Portuguesa). O Futsal é um jogo desportivo colectivo. Assim sendo, por ser um jogo colectivo, carece de organização. É portanto, táctico. E o que é a táctica? Além da definição inicial que transcrevi, táctica é o conjunto de comportamentos organizados que se deseja que a equipa manifeste em campo, ou seja, o conjunto dos princípios do jogar que dão corpo, forma e dinâmica ao modelo de jogo/forma de jogar idealizada/preconizada pelo treinador. É pois, uma cultura comportamental específica, que requer aprendizagem hierarquizada de comportamentos, rotinas e processos. Depreende-se assim que o jogo, e neste particular o Futsal, tem muito pouco de físico e muito de táctico. E dentro do táctico – da organização – a preocupação essencial é o jogar colectivo de acordo com um modelo de jogo adoptado, dotando os atletas de conhecimento e soluções para cada circunstância específica do jogo. Nunca a prioridade ou a primazia do processo de treino serão os aspectos físicos porque o jogo é táctico. Se é táctico, treina-se “o táctico”. Aquilo que diariamente se trabalha/treina são princípios e articulações entre princípios da forma de jogar (do ataque, da defesa, dos momentos de superioridade e inferioridade numérica, entre outros), com a certeza de que o vivenciar exacerbadamente dos mesmos implica, por arrastamento, adaptações específicas a nível técnico, psicológico e físico. Todos os exercícios de treino visam a aprendizagem, pela repetição sistemática, de comportamentos específicos do modelo de jogo construído e idealizado pelo treinador. O que se pretende, desde o primeiro treino da época, é um crescimento qualitativo da equipa relativamente ao desempenho colectivo pretendido e nada disto está relacionado, ou se relaciona, com aspectos físicos, patamares de rendimento ou “picos de forma”. O termo “forma”, como ainda (erradamente) se usa, deverá ser entendido, de forma mais global, como “rendimento desportivo”. E porque o processo de treino é global, não se separa nem divide o que se julga ser o técnico, táctico, físico, psicológico ou o mental, entre outros. Estes factores de rendimento são indissociáveis e treinam-se na sua globalidade, desde o primeiro dia da época (através dos exercícios de treino, dos feedback’s, da forma de liderar e gerir a planificação do processo de treino e do jogo, os recursos humanos, entre outros). A preocupação é operacionalizar o modelo de jogo e nela, as restantes dimensões permanecem em constante interacção. A força, resistência e velocidade, capacidade aeróbia e anaeróbia, não existem enquanto preocupações do “treinar”. O que se pretende é uma estabilização da identidade do “jogar” da equipa e isso requer a única e exclusiva preocupação em treinar a organizaçao de jogo. NÃO É FÍSICO, É TÁCTICO!!


REFERÊNCIAS:

1. “Em qualquer jogo desportivo colectivo, o primeiro problema que se coloca ao indivíduo que joga, é sempre de natureza táctica, isto é, o praticante deve saber o que fazer, para poder resolver o problema subsequente, o como fazer, seleccionando e utilizando o recurso mais adequado” (Garganta e Pinto, 1994).

2. Pelos recentes resultados da nossa Selecção Nacional – Clube Portugal, o melhor jogador do mundo arrisca-se a não participar no próximo Campeonato do Mundo de Futebol. Não temos sido suficientemente fortes, mas importa perceber onde estão as nossas fraquezas para se poderem transformar em forças. E não esquecendo que do outro lado (também) estão equipas/selecções/atletas de rendimento superior/top, teremos que ter capacidade (individual e colectiva) de encontrar soluções para tanta aglomeração defensiva em redor dos nossos fantasistas. Se houver superioridade numérica defensiva na zona da bola, a preocupação é tirar a bola da zona de pressão e fazê-la chegar rapidamente a corredores opostos. No Sábado a intenção esteve lá, mas faltou no lugar de Pivot onde actuou Pepe, melhor velocidade no passe e na decisão. Este jogo lembrou-me Paulo Sousa/Guardiola (muito rápidos a decidir com bola), Deco(imprevisibilidade) e até Maniche (fortíssima meia-distância). Aquele trio na zona central pareceu-me, antes e durante o jogo, demasiado! O que sobrou em quantidade, faltou em qualidade! Agora, façam-se contas. Outravez...

3. Sábado, 4 de Abril, 17h, AD Fundão x Sassoeiros. 23ª Jornada do Campeonato Nacional da 1ª Divisão de Futsal – FutSagres. Local: Pav. Municipal do Fundão.


(Este artigo foi publicado no Jornal Tribuna Desportiva, na sua edição de 31 de Março de 2009)

sábado, 28 de março de 2009

O blá blá blá é (muito) importante!

O resultado final, de um qualquer jogo desportivo (individual ou colectivo), é sempre o somatório de vários factores. Mas quer seja ele empate, derrota ou vitória, existem sempre factores presentes em todos os momentos, quer na preparação do jogo, quer durante o jogo, quer pós-jogo. Considero, nestes factores, o relacionamento (incluindo liderança e gestão) e a comunicação entre Treinadores e Atletas importante e em determinados momentos decisivo. Classifico este relacionamento em duas grandes áreas: a preparação da competição através do treino e a liderança exercida em todo o processo (quer na competição, quer no contexto social do atleta). Assim sendo, a comunicação deve ser honesta, responsável, competente, rigorosa e sempre orientada para a operacionalização de actos comportamentais direccioandos à execução de objectivos comuns. Se no processo de treino é objectivo preparar a equipa para tudo o que é passível de acontecer no jogo, é também importante durante o jogo saber antever e prognosticar as soluções táctico-estratégicas que permitirão superar o adversário. Actualmente, dificilmente um atleta acredita num treinador que ensina factores ou processos que nada têm a ver com o jogo, treinando sem relacionar as suas propostas com a realidade da competição. O relacionamento do treinador com o(s) atleta(s) obriga a um processo de comunicação claro, dirigido, específico, consciente, rigoroso e competente, contribuindo eficazmente para a concretização dos objectivos colectivos. Não confundam este relação através da comunicação como uma interferência de competências ou de “desautorizar” algo ou alguém. Apesar das diferenças, ambos estão profundamente empenhados na realização pessoal por intermédio do desporto. Pode haver divergências, mas importante é que perante o objectivo, as ideias se tornem comuns.

A comunicação entendida como um “factor” do processo de treino adquire uma importância decisiva quando o treinador (inteligentemente) usa a seu favor os meios e métodos que dispõe para influenciar as atitudes, comportamentos e a mentalidade dos jogadores. A linguagem utilizada em função do contexto (treino, jogo, balneário, comunicação social) e as expressões corporais (linguagem gestual) são os “pormenores” (que se tornam pormaiores) que os atletas vão adquirir e assimilar e mais importante que isso, reagir e actuar em função deles.

Um treinador pode ter grande conhecimento da modalidade, compreender as necessidades mentais e emocionais dos seus atletas mas o êxito ou o insucesso da sua actuação depende em grande parte da comunicação estabelecida e da forma como é efectuada. Quando o treinador falha na utilização das formas e das técnicas de comunicação o resultado pode ser desastroso.

Assim podemos perceber que por vezes, o sucesso/insucesso não se deve apenas à nossa forma de jogar. A interpretação, explicação e transmissão da mesma é tão ou mais importante como o “jogar bem e ganhar” que se pretende.


REFERÊNCIAS:

  1. “Só faz sentido existir o treinador se este for interventivo, mas interventivo no sentido catalisador da apreensão de tudo aquilo que é conveniente e importante para o crescimento do processo”, in Vitor Frade, 2003
  2. Estamos “cheios” de Taça da Liga, mas falo nisto apenas por uma mera curiosidade: não se lembra Paulo Bento (e demais opinião pública) que 3 dos seus jogadores (profissionais de futebol) falharam na execução de um remate com oposição apenas do GR, a 11 metros da baliza? Tanto falou (e falam) do resto que se “esqueceu” (e esquecem) desta incompetência. Juntando as duas equipas, em 10 atletas, 5 falharam!
  3. No Futsal, já estão apuradas as 12 Selecções que vão disputar o Campeonato da Europa, em Janeiro de 2010, na Hungria. Hungria (país anfitrião), Ucrânia, Espanha, República Checa, Itália, Bélgica, Portugal, Rússia, Bielorrúsia, Sérvia, Azerbaijão e Eslovénia. A fase final vai contar pela primeira vez com 12 finalistas (ao invés de oito) e realiza-se de 19 a 30 de Janeiro de 2010.
  4. Ainda no Futsal, uma boa e interessante notícia anunciada pelo Seleccionador Nacional de Futsal: de 5 a 8 de Abril vai decorrer em Lisboa um estágio com 28 jogadores, sendo 14 de Selecção “B” e 14 de Selecção sub-21. Uma longa caminhada inicia-se com pequenos passos, e esta iniciativa pode ser o começo.

(Este artigo foi publicado no Jornal Tribuna Desportiva, na sua edição de 24 de Março de 2009)

quarta-feira, 18 de março de 2009

Ainda?

Aqui neste espaço já falei anteriormente de várias formas de treinar/trabalhar, independentemente de concepções, convicções, ideias e até algumas invenções. Como sabem, a Selecção Nacional de Futsal está reunida para participar na fase de apuramento para o próximo europeu de Futsal – Hungria 2010, e por isso também, o Campeonato da 1ª Divisão encontra-se parado. Aproveitou a nossa Selecção para realizar dois jogos particulares com a vice-campeã do Mundo – Espanha, no país vizinho. Realizados na Sexta-feira e no Sábado, os resultados foram 1-0 e 4-1, desfavoráveis a Portugal. Assim como Portugal, também a Espanha está envolvida na fase de apuramento, ou seja, ambas as Selecções/Equipas prepararam os jogos de apuramento com estes dois particulares. Até aqui, nada de estranho. O que para mim é estranho e de difícil aceitação e compreensão é ler as declarações do Seleccionador Espanhol de Futsal após os jogos realizados frente a Portugal. Após o primeiro jogo (1-0), José Venancio López disse, e passo a citar: “a equipa esteve muito bem porque chegámos a este jogo com bastante carga de trabalho físico e não tivemos a velocidade necessária. Eles estiveram mais rápidos mas contudo, soubemos contrariar essa superioridade com base no esforço e no uso de recursos tácticos.”. Após este jogo e antevendo o jogo do dia seguinte, perguntaram ao Seleccionador Espanhol se não o preocupava o cansaço acumulado com os treinos e estes jogos, com vista aos jogos do apuramento, no próximo fim de semana, ao que José Venancio López respondeu o seguinte: “não, não me preocupa. É normal que a equipa não tenha tanta frescura nesta altura, e isso está dentro do previsto. Na próxima semana o trabalho será fundamentalmente táctico e os jogadores estarão melhor fisicamente.”. Já no Sábado, e após o jogo (4-1), José Venancio López disse, e passo a citar: “destaco a inteligência com que jogámos, porque a excessiva carga de trabalho não nos deixou realizar o jogo que tínhamos previsto.”.

Bem sei que não é correcto da minha parte avaliar ou criticar esta forma de trabalhar, sendo este senhor e aquela selecção Vice-Campeã do Mundo de Futsal e uma referência para a modalidade, mas não posso deixar de estranhar esta concepção (ainda) utilizada pela selecção espanhola. Sei também que o Futsal Espanhol – assim como o Brasileiro – tem na vertente física uma grande preponderância e uma particularidade que os tem aompanhado ao longo dos anos, mas esta ideia/concepção ao nível do treino neste nível de rendimento (de top) deixa-me com a firme sensação e convicção que nós portugueses (treinadores portugueses) estamos cada vez melhor preparados para operacionalizar e concretizar no processo de treino as preocupações que o jogo nos coloca, deixando de lado a excessiva preocupação com a vertente física descontextualizada, não dissociando o físico do táctico (do estratégico, do mental, entre outros). O Futsal é um jogo. Um jogo desportivo colectivo e por isso carece de comportamentos colectivos ordenados e organizados em função de uma ideia de jogar, por isso é um jogo essencialmente táctico. Não deixo assim de ler com alguma surpresa e até admiração que ainda se utilizem métodos de trabalho analíticos e descontextualizados, sobretudo quando (no trabalho de selecções) apenas se tem os atletas à disposição uma/duas semanas.

Continuarei admirador e atento à forma de jogar da Espanha – e do Brasil, bem como da forma de gerir e liderar dos seus respectivos treinadores, mas as formas de treinar assentes em concepções (independentemente de melhores ou piores) com as quais não me identifico na sua totalidade, não vão alterar as minhas ideias, convicções e concepções.

E porque tudo o que seja favorável ao crescimento qualititativo da minha concepção – da minha forma de jogar – é passível de interesse, não renuncio a nada e continuarei a procurar ideias/conhecimento/concepções/experiências de todo o lado. Boas ou más, melhores ou piores, isso depois decido eu.


REFERÊNCIAS:

  1. Através do site da Federação Portuguesa de Futebol, ficámos a saber quais as preocupações do nosso Seleccionador durante a semana de treinos que antecederam estes jogos com Espanha e uma coisa vos transmito – nada tem a ver com processos analíticos, descontextualizados ou que ponham em causa o dissociar de todos os factores intervenientes no jogo. E porque Portugal perdeu, acham que se mudam convicções ou concepções?
  2. No Futebol, gostaria de partilhar 3 ideias soltas: a derrota do Sporting CP na Liga dos Campeões será (infelizmente) para sempre eternizada; a segurança, consistência, organização (desportiva e administrativa) e qualidade do FC Porto (na Liga dos Campeões e sobretudo na Liga Sagres) é superior aos restantes adversários; Mourinho tem a vida (de Treinador) em Itália cada vez mais difícil – os italianos são demasiado genuínos e têm dificuldade em se habituar a quem vem de fora (e se esse alguém for Mourinho, mais difícil se torna).

(Este artigo foi publicado no Jornal Tribuna Desportiva, na sua edição de 17 de Março de 2009)